sábado, 1 de novembro de 2008

Fable II (exclusivo XBox 360) - Análise

A história de Fable 2 é de vingança, mas não tão profunda como se esperaria. Aliás, o destaque da Lionhead centrou-se acima de tudo no respirar deste mundo, dos seus aldeões, da vida que podemos ter para além da demanda heróica. Poderão durante muito tempo ignorar a vossa missão, centrando-se nos afazeres do dia-a-dia de Albion, enveredar por profissões, comprar casas e estabelecimentos, e até, quem diria, casar e formar família, garantindo a descendência. É esta a grande ambição de Molyneux, permitir que o jogador usufruísse e pagasse pelos seus actos, remodelando o mundo ao seu redor, de uma forma persistente, salientando a noção de tempo.

No pensamento de Molyneux, combater a ambição da complexidade deste jogo era dotá-lo de mecânicas bem simples, de forma a não se tornar aborrecido, tendo em conta o seu género. O preço a pagar foi elevado, ou melhor, estamos perante um RPG de acção light, um jogo apontado mais para os jogadores casuais do que propriamente os fanáticos das experiências mais hardcore. Desta forma, estamos perante um jogo simples de progredir, muito organizado, impossível de morrer e sem penalizações pelo facto. É um jogo que prima pelas relações sociais do jogador com os NPCs, dotando-os de uma vida mais credível que o habitual. É um excelente jogo, mas poderia ser ainda melhor não fossem alguns problemas, nomeadamente bugs na activação de algumas demandas, ou a inteligência artificial dos inimigos desse mais luta nos combates.


Uma das melhores mecânicas deste título é sem dúvida a possibilidade de jogarmos com um amigo num sistema cooperativo, drop in/drop out. Este formato pode ser jogado na mesma consola ou online, através do Live. A forma como o próprio cenário de jogo se transforma num gigantesco hub de jogadores que deambulam nos seus afazeres, como se de um MMO se tratasse, é de se tirar o chapéu, lembrando-nos um pouco a estrutura de Test Drive Unlimited. Não pensem que vêem o que os outros jogadores estão a fazer, pois a sua presença limita-se ao avatar do seu gamerscore, mas podemos falar em tempo real através do headset, trocar objectos e, claro, convidar ou aceitar convites para cooperação.

Infelizmente o modo cooperativo na mesma consola não é tão eficaz. Sendo visíveis dois jogadores no mesmo ecrã, irão deparar-se com uma câmara fixa e automática, tentando gerir as duas personagens. Mas não deixa de ser confuso manter-nos focados nos mesmos elementos, e sempre que ambos os jogadores decidem rumar a direcções opostas poderão deparar-se com algumas atrapalhações. Além disso, a detecção de colisão não é perfeita, ficando as personagens presas no cenário, ou quando rodeados de NPCs, terão dificuldades em caminhar.
Claro que a experiência a dois é bem mais gratificante e mais divertida. Existem alguns combos partilhados nos combates e a exploração com troca de ideias é bem mais interessante. Além disso, não só podem partilhar as façanhas, um a reboque do outro, como o jogo equilibra a experiência de ambos.

A ambição de Fable 2 é dotar todo o ambiente de vida própria, tentando inserir noções de tempo, marcas persistentes derivadas das escolhas e acções dos jogadores. Assim, tendo em conta que poderão optar por um alinhamento bom ou mau de personagem, todo o ambiente irá reflectir-se nesse aspecto do jogador. Existem escolhas e consequências nas demandas propostas e desde início que isso fica patente. Como referi, começamos a aventura ainda em criança, fazendo algumas quests até accionarmos o salto temporal que ditará o verdadeiro início desta aventura.

Quando crescemos, teremos acesso ao enorme mundo de Albion, dividido em regiões, com aldeias, acampamentos e muitas masmorras para visitar. Podemos interagir com todas as personagens que encontramos, realçando a importância dos emotes que podemos utilizar. Estas relações podem ser de medo, amizade ou mesmo amor, consoante a nossa postura. Um pouco como vimos em Black & White, as nossas acções geram reacções díspares entre os presentes, em que o simples desembainhar da nossa espada em plena praça poderá desencadear o caos e muitos fugirem de medo, baixando obviamente as estatísticas de reconhecimento.

Desta forma, e lembrando-nos jogos como os Sims, a nossa personagem poderá executar diversas acções, desde a dança, um assobio, os engates, os gestos obscenos e até agressivos. São dezenas de acções possíveis, capazes de gerar simpatia, medo ou ódio pelo nosso herói. Aliás, tal como o primeiro jogo, a nossa personagem é muda, diminuindo-lhe em muito o carisma necessário para um jogo desta natureza. Até porque os diálogos, ou melhor, monólogos dos NPCs estão fabulosos, e as nossas respostas serão dadas em grande parte através destas emoções.


Desta forma, o objectivo é tentar conquistar a população, gerando reconhecimento. Este reconhecimento afecta diversos aspectos, como por exemplo o acesso a certas demandas principais. Afecta ainda elementos como o preço dos objectos a comprar, as recompensas e ordenados dos trabalhos, e assim por diante. De lembrar que este RPG não é amigo do espólio. A própria Lionhead salienta que destruir caixotes e barris é divertido, mas nunca poderíamos esperar que alguém escondesse dentro destes objectos valiosos, certo? Nem estão à espera que cada mob eliminado vos recompense monetariamente, ou mesmo a finalização de demandas, excepto casos específicos? Como disse, o reconhecimento aqui vale dinheiro, mas se o queres mesmo terás de trabalhar!

Muitas das relações sociais são afectadas igualmente pelo nosso aspecto. Será possível, como calculam, caracterizar a nossa personagem, no que diz respeito a roupas, tatuagens e ornamentos. No entanto, existem aspectos em que não podemos interferir, como por exemplo as cicatrizes deixadas pelos combates. Como não temos grandes penalizações por morrer, a nossa personagem torna-se numa pessoa marcada, com cicatrizes no corpo e cara, muitas delas permanentes. Da mesma forma que pode emagrecer ou engordar, por aquilo que ingerimos.

Tornar-se uma pessoa poderosa, reconhecida e, claro, rica, é um dos aspectos em que a equipa de Molyneux mais trabalhou para imergir o jogador. Aqui não temos acesso a nada de forma simples. Não existem armas em cada inimigo ou objectos que possam ser vendidos de forma fácil, tampouco inventários para gerir. Terão de procurar riqueza em baús escondidos ou escavar buracos, mas acima de tudo fazendo negócio e trabalhando arduamente. Os mais preguiçosos podem sempre jogar jogos de sorte (os famosos Pub Games), ou simplesmente roubar!

Muitos destes aspectos são disponibilizados num formato de mini-jogos, principalmente os empregos - madeireiro, ferreiro, barman, entre outros. São simples e até aborrecidos, mas serão uma forma simples (e honesta) de começar a vida. Podem fazer trabalhos de caçadores de prémios, mas o mais interessante será certamente o investimento possível. Do que vale termos afinal uma carteira cheia de dinheiro ali parada, quando podemos comprar qualquer edifício de Albion? Esta é uma das principais mecânicas deste jogo. Todos os edifícios têm um custo consoante a sua qualidade. Desta forma, se inicialmente temos uns trocos para comprar uma carroça de cigano, mais tarde teremos dinheiro para uma casa a sério e quem sabe um castelo? É aqui que é salientando o formato sandbox deste RPG. Podemos comprar uma casa e alugar, mas mais interessante é ter acesso às lojas de todos os produtos de Albion e explorá-los. Em todas as regiões temos acesso a diversas lojas à venda, algumas são grandes pechinchas, principalmente se decidirem matar o seu dono. São estes actos que nos ajudam a imergir neste mundo, é possível arrombar casas e roubar objectos, caso o vosso papel tenha tendências más.


Claro que estes aspectos, embora dinâmicos, não têm um verdadeiro peso no jogo. Se partirem em aventuras podem sempre regressar a casa (cada salto entre regiões tem um custo temporal em horas e algumas missões da demanda principal custam mesmo anos de vida à personagem). Terão estatísticas de satisfação da nossa esposa, até ao ponto de esta se divorciar de nós, ou mesmo morrer e ficarmos viúvos. Caso optem por ignorar a família não terão grandes penalizações, excepto a diminuição dos subsídios.

As consequências dos nossos actos fazem-se sentir. Podem ligar uma protecção que permite atacar ou não inocentes, no caso de optarmos por uma chacina. Se matarem uma personagem com uma demanda, o mais provável é essa missão não ser activada no futuro. Por isso é que não são assim tantas as demandas da história principal e num jogo desta natureza, se optarem por seguir esse rumo, conseguirão finalizá-la em pouco mais de uma dezena de horas...

Outra das mecânicas interessantes prometidas e que mais curiosidade gerou no seio da comunidade é o nosso cão. O contacto com o animal acontecerá quando ainda somos crianças e este irá acompanhar-nos em praticamente toda a aventura. Trata-se de um ser completamente autónomo e terá grande utilidade como uma espécie de radar. Sempre que nos aproximamos de uma arca de tesouro, ele irá ladrar e guiar-nos até ela, para mais bem escondida que esteja, ou mesmo algo enterrado. O seu sentido irá avisar-nos quando existem inimigos escondidos para nos emboscar.

Sendo um RPG de acção, os combates terão de fazer parte da experiência. Neste título o desenvolvimento da personagem em termos de combate passa por três formas: ataques de proximidade, armas de distância e magias. Assim, consoante o formato que mais usarem, mais pontos irão ganhar para distribuir nas respectivas características. Estes são representados por esferas coloridas de acordo com os botões de ataque do comando - amarelo, azul e vermelho. Além da experiência das armas, irão ganhar uma tonalidade verde, geral, que pode ser contabilizada com as restantes.
Quanto ao mundo de Albion, são de facto visíveis mudanças ao longo dos anos. Aldeias que evoluíram para pequenas cidades ou mesmo locais que foram modificados graças às nossas acções. Em determinada altura, uma ponte cortada, outrora controlada por bandidos e que impedia a passagem, foi mais tarde, após a nossa limpeza, reconstruída e utilizada.


Albion é composto por diversas regiões intercaladas. Será possível andar a pé até ao seu destino, ou simplesmente saltar de imediato, poupando tempo. Um aspecto que deixa a desejar é o mapa do diário, que não nos dá as informações de uma forma fácil. Por vezes iremos andar perdidos à procura do caminho correcto a seguir.

Fable 2 é uma experiência obrigatória na Xbox 360. Não é certamente o RPG puro e hardcore que os jogadores mais experientes esperariam, mas é vasto e divertido. O mundo de Albion não se esgota no final da aventura, abrindo-se ao desenvolvimento de actividades, como se vivêssemos neste mundo mágico. Existem ideias fantásticas, outras que funcionam como um extra, mas no final a experiência é muito satisfatória. O prometido suporte online para o formato cooperativo irá tornar a experiência ainda mais divertida e certamente um dos trunfos desta obra.



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